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Apesar da reconhecida eficiência das ferramentas analíticas de otimização na geração de planejamentos mais aderentes e rentáveis, não é raro as empresas postergarem ou simplesmente ignorarem os investimentos nessa tecnologia. Mas será que as razões usualmente empregadas para explicar esse efeito realmente fazem sentido? Será que as razões são tão difíceis de resolver a ponto de deixar para o futuro resultados expressivos que já podem ser percebidos hoje? Este artigo discute alguns desses pontos.

Já se foi o tempo em que a maior barreira para a implantação de ferramentas analíticas era a falta de infraestrutura de hardware capaz de, em tempo adequado ao processo decisório da empresa, executar os modelos matemáticos e tratar cenários de planejamento compostos por milhares de variáveis.

De forma semelhante, também não há mais impedimentos relacionados à parte de software. O Mercado  já conta com diversas linguagens algébricas que aceleram o desenvolvimento de ferramentas de otimização e facilitam sua manutenção evolutiva através da flexibilização dos recursos de modelagem. Atualmente, com essas plataformas específicas, é possível desenvolver, em um curto espaço de tempo, ferramentas analíticas capazes de tratar problemas complexos e de grande porte.

Não obstante a essa evolução das técnicas e equipamentos, a implantação de ferramentas analíticas para otimização dos planejamentos continua a enfrentar um conjunto de barreiras nas organizações, porém ligadas agora a questões mais funcionais.

 

 

Precisamos melhorar a qualidade de nossas informações

 

Boa parte dos gestores com quem tive contato compartilha do pensamento de que os processos de otimização dos planejamentos só devam ser efetivamente disparados quando todos os dados da empresa estiverem absolutamente tratados e disponíveis.

Confesso também já ter enunciado a inviabilidade de otimização de planejamentos em decorrência da impossibilidade de montagem de cenários minimamente confiáveis, em função da baixa qualidade das informações disponíveis. Isso foi antes de entender, com a prática, de que na extensa maioria das situações a implantação de ferramentas analíticas atua como guia definitivo na limpeza e tratamento das informações que são realmente necessárias e que impactam de forma significativa na qualidade dos resultados gerados por essas ferramentas.  Nesse sentido, após anos de experiência no desenvolvimento e implementação nas mais diversas áreas de aplicação, não tenho dúvidas de que a melhor abordagem é aquela que inclui as atividades de tratamento de qualidade das informações no cronograma de desenvolvimento e/ou implantação da própria ferramenta.

Em outras palavras, o tratamento de informações que servirão de base aos cenários de otimização deve ser guiado pelas necessidades específicas da ferramenta analítica em foco e deve ser entendido como parte do processo.

Uma realidade que testemunho ser repetida inúmeras vezes nas corporações é de que ao se encarar o processo de levantamento ou de disponibilização das informações como uma atividade isolada ao projeto de otimização gera-se uma prejudicial falta de foco no tratamento dessas informações.

Se associarmos essa falta de foco (i) à imensidão de informações da empresa, (ii) à usual falta de confiança na sua qualidade ou origem, (iii) à sua dispersão em planilhas, ERPs e sistemas legados em uso na empresa e (iv) à falta de conexão formal entre as informações disponíveis; o desafio de  operacionalizar a base torna-se inviável sem conhecimento exato do subconjunto de informações realmente vitais à qualidade do planejamento. Não é incomum as situações em que a implementação de ferramentas de planejamento, que usualmente retornam resultados diretos significativos em poucos meses de uso, ser postergada em anos ou simplesmente não ser realizada, privando a empresa de melhorias importantes em seus processos.

Recentemente, acompanhei de perto o desenvolvimento e a implantação de Otimizadores em uma cadeia de proteína animal, desde o plano de aquisição dos animais até a programação de atendimento final dos mercados. Por inúmeras vezes, durante as discussões de pré-vendas, a empresa demonstrou a preocupação com a inviabilidade do projeto pela falta de qualidade nos dados de rendimentos de corte das peças, essencial para a correta geração dos planos de desmonte das carcaças. Entendendo a urgência na obtenção de melhores resultados de seus planejamentos e seguindo a orientação de tratamento simultâneo das informações que prego aqui, a empresa adotou uma estratégia a ser conduzida em tempo de projeto que consistia (i) no delineamento de experimentos nas linhas produtivas para refinamento das informações de rendimento, (ii) modelagem estatística dos dados históricos de produção e (iii) validação e ajuste das informações pela equipe de pesquisa e desenvolvimento de produtos da empresa. Além de viabilizar o projeto em tempo hábil, a constante interação entre as equipes de implementação da ferramenta analítica e de tratamento das informações permitiu identificar variações de rendimento por gênero e manejo dos animais não conhecidas pela empresa e não previstas originalmente no modelo matemático dos Otimizadores.

 

Vamos implantar um ERP

 

Confesso um enorme alívio no fato do Mercado agora reconhecer, com mais propriedade, as diferenças de enfoque entre os sistemas transacionais e as ferramentas analíticas, principalmente no que se refere ao suporte a decisões de planejamento.

Nem sempre foi assim. Lembro que, não muito distante no tempo, no início dos anos 2000, naquela fase do Bug do Milênio, o frisson causado pela corrida de implantações dos sistemas ERPs, acompanhado pela falsa promessa ou, no mínimo, da não realizada expectativa das empresas de que essas ferramentas transacionais equacionariam todos os desafios de gestão, de controle, de predição e (acima de tudo) de planejamento, causaram uma queda brutal na evolução das ferramentas analíticas como suporte às decisões nas companhias.

Não é necessário dizer que esse movimento intenso de implantação dos ERPs teve impactos muito positivos na formação de bases centralizadas (reduzindo a duplicidade de informações), no compartilhamento ordenado de dados, no controle e segurança de acesso de usuários, na governança corporativa e sobretudo, na formalização sistêmica dos processos transacionais das empresas.

Em contrapartida, foram necessários mais de 3 anos, a partir do início da implantação desses sistemas, para que as empresas começassem a dar conta de que eles não continham os elementos de inteligência computacional para endereçar de forma correta as complexidades e os desafios da tomada de decisões de planejamento.

Conscientes de que o Mercado voltava a valorizar iniciativas analíticas como solução para a geração de planejamentos mais aderentes e lucrativos, boa parte dos grandes fornecedores de ERP investiram elevados recursos no desenvolvimento de ferramentas próprias de otimização e suporte à decisão, os APS – Advanced Planning Systems. Para ganhar mercado, a estratégia dessas empresas foi refazer todo o discurso anterior tendo essas ferramentas como novo pivô. Sem dúvida, a iniciativa era, no mínimo, confortável sob o ponto de vista de “compliance” com o ERP instalado, mas mostrou-se ineficiente na extensa maioria dos casos por um motivo básico: a abordagem continuou a ser transacional, desprezando os aspectos analíticos que conferiam valor ao processo decisório. Essas ferramentas não permitiam flexibilidade na representação da especificidade dos processos de cada empresa e os profissionais responsáveis por sua implantação não detinham o conhecimento para a correta representação do planejamento nos modelos matemáticos por trás da interface.

Via de regra, ainda hoje, a fase de implantação de ERP na empresa representa um período de postergação de investimentos na otimização dos planejamentos, muitas vezes explicada pelo deslocamento de colaboradores funcionais e técnicos para discussão dos modelos conceituais que permitirão a representação dos processos transacionais no sistema. O curioso está no fato de que é justamente essa discussão de modelos conceituais que justifica conduzir a implementação das ferramentas analíticas de planejamento conjuntamente com a implantação do ERP.

Há que se considerar que boa parte das representações a serem feitas no ERP devem estar alinhadas com as necessidades das informações das ferramentas analíticas, e vice-versa. Realizar um trabalho conjunto que envolva simultaneamente a equipe de negócio da empresa e as equipes de implementação das ferramentas transacional e analítica evita retrabalhos, reduz investimentos e permite que as representações de processos sejam feitas de forma sinérgica nos dois tipos de ferramentas.

 

Adotamos simplificações no planejamento

 

Costumo repetir, nas constantes análises de viabilidade de otimização das quais participo, que duas características são essenciais para justificar o emprego de ferramentas analíticas como suporte ao processo decisório: escala e complexidade.

A escala produtiva ou logística é o que justifica financeiramente o investimento em ferramentas dessa natureza e garante a percepção de resultados expressivos em muito pouco tempo de aplicação. Para exemplificar, venho participando de implementações de sistemas otimizadores com payback em poucos meses: um caso bem ilustrativo é o da BSC – Bahia Specialty Cellulose, única produtora de celulose solúvel com alto teor de pureza da América Latina, que teve retorno em apenas 2 meses de seu investimento em uma ferramenta para planejamento tático do abastecimento de madeiras (Monfil Cardona, 2013). Já presenciei casos ainda mais extremos na cadeia siderúrgica, mais especificamente na programação de abastecimento e mistura de carvões para as coquerias, em que reduções da ordem de 10% na necessidade de compra dessa matéria-prima propiciaram paybacks em menos de 1 mês de utilização das ferramentas.

A complexidade, por sua vez, é o que justifica funcionalmente a adoção de metodologias analíticas para geração otimizada dos planejamentos e programações da empresa. É a característica que dificulta ou mesmo impede, aos planejadores desprovidos de ferramentas adequadas a esse fim, a identificação das políticas de ação que trariam maior rentabilidade à empresa.

Por mais absurdo que seja, ainda é comum encontrar gestores que subestimem a complexidade de seus planejamentos ou pior, que conheçam os desafios de suas cadeias, mas que admitam como aceitáveis soluções com base em planilhas ou na simplificação das decisões a serem tomadas (Moura, 2013).

Há alguns anos, por exemplo, tive contato com uma empresa de varejo que realizava as programações de reabastecimento de suas lojas utilizando uma estrutura de rotas fixas, executadas sistematicamente pelos mesmos tipos de caminhões e com frequências de atendimento pré-determinadas. Essas fixações haviam sido estabelecidas com o intuito de reduzir o universo de decisões e facilitar a rotina de planejamento dos responsáveis pela logística. Em contrapartida, criavam restrições artificiais no processo por não admitir flexibilizações necessárias, por exemplo, em função das oscilações de demanda de cada ponto de entrega. Alheios a essa estratégia de reabastecimento engessada, os gestores admitiam como aceitáveis os resultados obtidos. Apesar de algumas resistências iniciais, um rápido estudo realizado para analisar os ganhos potenciais com a adoção de modelos otimizadores apontou para incrementos acima de 50% no nível de atendimento, concomitantes a reduções de mais de 20% no custo unitário de transporte.

Nas situações em que o corpo gerencial da empresa está acomodado com o tratamento inadequado das complexidades no planejamento, por meio de políticas de ação simplistas, sem visibilidade dos prováveis ganhos no seu processo decisório e resistente à adoção de ferramentas analíticas adequadas, um artifício bastante eficaz é a realização, ainda em tempo comercial, de um POC  – Proof of Concepts. A ideia consiste em utilizar um cenário reduzido de planejamento (que necessariamente contenha decisões de valor para a empresa) e gerar o plano com o uso de protótipos operacionais da ferramenta analítica a ser desenvolvida e implantada. O resultado dessas execuções é então comparado com aquele gerado pelos métodos atuais da empresa. Usualmente, essa comparação mostra não só que a empresa está no momento de otimizar seu planejamento, como também auxilia no processo de venda interna da ferramenta por meio do dimensionamento do payback.

 

Uma discussão ainda inacabada

 

Sem dúvida, há ainda um conjunto de outras questões que tornam nebuloso o melhor momento para otimização dos planejamentos da empresa e quais são as ações necessárias para que a decisão de implementação tenha como consequência resultados expressivos. Por essa razão, não finalizo o artigo com conclusões ou com resumo dos pontos abordados e sim, com o compromisso de voltar a discutir se questões como cenários de planejamento com grandes incertezas, falta de cultura de planejamento, indisponibilidade de recursos de TI, entre outros, tornam a empresa inapta à adoção de metodologias otimizadoras.

 

Referências

 

Monfil Cardona, Sônia, “Do campo à fábrica: muitas variáveis”, Tecnologística, Ano XIX, Nro. 213, pp. 66-74, Agosto/2013.

Moura, Luciano, “As Armadilhas do Bom Senso nos Planejamentos da Cadeia”, Mundo Logística, Ano VII, Nro. 37, pp. 8-12, Novembro-Dezembro/2013.

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